quarta-feira, 22 de março de 2017

RASTROS NA CIDADE

MARCOLINO OU TIÃO MARCOLINO.

Uma figura humana, a nosso ver, talvez pareça um pouco mais humana por ser o mais mineiro dos mineiros.

Gostava de contar piadas sujas e ouvi-las também para reproduzi-las de seu jeito e, às vezes,  com alguns acréscimos especiais para os amigos.

Trabalhou no bar do Juca nos idos tempos, depois teve seu próprio bar de “Causos e Proseios” na Garção Stockler. Lugar de encontro e reencontro de e com velhos companheiros de aventuras e lidas da vida. Com seu jeito especial e calmo, passou a conquistar os mais jovens que iam se achegando e se acostumando com o ambiente acolhedor perto da lotérica.

O bar sempre cheio de gente da roça, da cidade e de fora, todos no mesmo barco, na mesma busca de paz e alegria, proseavam, bebiam e comiam os petiscos feitos por ele. Os assuntos eram muitos e variados, iam desde o futebol, à putaria e conversa fiada.

Ali teve figuras marcantes, sem prejuízo de outras “figuraças” que lá frequentavam, é possível citar um em especial: o Motorzinho, que embora já tenha pela noite e atravessado para outra margem do Rio Jordão, não há como esquecê-lo sempre presente naquele recanto.

Diga-se de passagem, e como ato de extrema solidariedade, Tião Marcolino, na época em que o “azuzinho” era raro, ele sempre tinha alguns no bolso para servir os amigos mais inseguros. Nunca se soube exatamente como ele conseguia essa coisa milagrosa.

Seu carisma nunca deixou de ser contagiante. Com o peso do passar dos anos foi perdendo a postura de um homem espigado, mas nunca deixou de carregar a sua experiência e transmiti-la com sabedoria aos mais jovens.

O que falar desse personagem? Usar os adjetivos surrados que nada ou quase nada podem expressar sobre ele? Não! Tião Marcolino merece mais, merece dizer que sua passagem por essa cidade deixou cores e lembranças que não podem e não devem ser esquecidas — lembranças de humildade e alegria. 

Marcolino amou a todos viventes, incluindo  animais abandonados e vadios. Já na velhice,com a dignidade de quem nunca desiste, carregava galões pesados cheio de água, mas não deixava de parar para trocar uma prosa com um conhecido ou contar uma piada.

Pisou, andou e deixou seu rastro sinalizado com harmonia e beleza por esta pequena e amável cidade de Lambari. Tião foi uma luz na calçada que fluía junto com o sol da manhã para alegria de todos.


Jorge Lemos

terça-feira, 21 de março de 2017

GRILO AZUL



Acho você, a exemplo de outras jovens, uma criança maravilhosa! Carente de afeto, cores e fantasias. Vejo-a como uma borboleta recém saída do casulo — ainda muito sensível e perplexa com os contrastes do mundo.
Agora, meu amor, esqueça por algum momento a timidez, a dúvida e o medo. Venha! Vamos fazer uma viagem no mundo das boas ilusões.
Você será levada na saliência de uma pétala de rosa sobre a calmaria de uma lagoa rasa, mansa e incolor e, para ajudar deslizar a pétala sobre a superfície dessa lagoa, centenas de peixes coloridos cantarão, em coro, a canção celestial do amor. Então, perdendo aos poucos a timidez, a dúvida e o medo, suas asas multicoloridas refletirão na paisagem a beleza do sol da manhã.
Seus olhos fitarão o horizonte e a certeza de uma felicidade invadirá seu corpo.
Sua boca abrirá espontaneamente para ajudar a cantar as belezas das montanhas, dos riachos e dos rios que riscam a Terra.
Tudo será harmonia e muito amor nas palavras que sairão dos seus lábios em forma de canção.
Nas margens da lagoa, todos irão parar e ouvi-la em silêncio.
Numa pequena enseada há uma minúscula carruagem feita com pequenos ramos de arbustos, cujos varais são presos por fios de seda em torno do Grilo Azul.
Ele espera impaciente a chegada da pétala com a bela passageira, para conduzi-la através dos caminhos de terra batida feitos pelas patas de animais silvestres.
Sua carruagem, após percorrer as colinas mágicas, atravessará uma ponte feita com a névoa de uma cachoeira de água cristalina.
Além da ponte há uma planície  com flores de todas as cores, exalando sem parar, seus perfumes sobre a sua carruagem.
O Grilo Azul sabe que está conduzindo a passageira de um sonho, portanto, irá levá-la a montanha de cristal.
Quando você chegar irá encontrar uma elevação azul se confundindo com o céu.
Um tapete vermelho estará cobrindo a escadaria até o portal aureolado por luzes vindo do infinito que iluminam o interior da montanha.
Uma mulher, com o sorriso acolhedor, irá lhe conduzir ao adro interno da montanha sagrada.
Você avistará, descansando junto ao moinho sob árvores frondosas, o Grilo que a levou àquele lugar.
Seus olhos se encherão de lágrimas ao descobrirem que foi um simples grilo que criou as fantasias coloridas só para arrastá-la, por uns instantes, desse mundo onde as trevas tentam vencer a luz.
Jorge Lemos