sábado, 26 de novembro de 2016

CAIPIRA



No município de Lambari/MG tem gente que parece mais gente do que gente;   gente simples, gente mais pura na alegria e na dor, gente de nossa terra querida de Minas.

 Quase maduro, ou maduro mesmo, cabelos brancos e rarefeitos ou desfeitos pelos anos, franzia o semblante no entorno dos olhos que se abriam e se fechavam com a paciência daqueles que já chegaram aos sessenta.

  Tiras murchas debaixo da barba desciam pelo rosto magro para encontrar com outras no pescoço mal protegido pelo colarinho surrado da camisa de cor desfeita pelas tantas e repetidas lavagens.

As mãos magras, cobertas por manchas escuras feitas pelos raios venenosos do sol na lavoura de café, carregavam nas palmas a aspereza das pedras para se proteger contra o sangramento arranjado pelo cabo da enxada na capina ignorada.

Esperando para conseguir um empréstimo no Banco do Brasil, olhava para dentro de si como peixe tirado da água naquele instante — pretendia replantar o cafezal prestes a morrer.

Sentado à confortável cadeira na frente do servidor segurava com palma e todos os dedos da mão um copinho descartável já vazio.

Depois de ouvir a extensa e rodopiante explicação do rapaz do banco, pôde entender sem entender quase nada que não lhe seria concedido o empréstimo.

Fez uma expressão de profundo desgosto, sem dizer uma palavra, deixou bem devagar o copinho sobre a mesa e saiu com os passos lentos e curtos com as mãos procurando  alguma coisa no embornal.

Na rua seu olhar saiu de si voou para as colinas ao redor da cidade, subiu as serras em direção ao bairro do Congonhal e, com a imaginação, chegou à sofrida lavoura de café — o verde esfolado e triste estava imóvel como se o esperasse.  

Uma realidade ressecada pela força da verdade penetrou-lhe na alma mais oculta e mostrou-lhe o quanto não valia nada o seu sonho...

Logo a sua vontade foi despida, ficou nua e com vergonha.

 Durante a juventude roubada pelo trabalho árduo e sem letras foram somados sacrifícios com adjetivos cheios de valores éticos, mas absolutamente anônimos.

Jorge Lemos

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